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"A eternidade é logo ali" - Crônica de Adriano Nogueira

"A eternidade é logo ali" - Crônica de Adriano Nogueira

Data de Publicação: 2 de novembro de 2022 21:06:00

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Por Adriano Nogueira

A eternidade é logo ali 

 

Fim de tarde, início de noite fria. A escuridão vem chegando. Na véspera do Dia de Finados, cá estou no Cemitério Municipal.

Fico, por um momento, imóvel, inerte, pensativo, olhando o infinito sobre o vilarejo dos mortos tendo ao fundo uma imagem linda do majestoso pôr do sol, mesmo assim, de repente, o lugar parece ficar com um ar sombrio, sensação estranha.

Sentimentos se misturam causando confusão em meu ser. Sobressai a tristeza acompanhada de medo, como se a vida estivesse à beira do abismo, como que se fosse o meu último dia.

Tento fugir desse estado emocional melancólico e desagradável. Olho para o Oeste, por cima do muro baixo, vejo as luzes já acessas clareando a cidade de Ribas do Rio Pardo. Percebo que há duas cidades no mesmo plano, contudo, separadas, talvez pela vida ou pela morte. Uma com casas edificadas para cima, a outra com casas minúsculas para dentro do chão. Uma grande, passageira, de muito movimento, barulho e claridade. A outra, uma cidadezinha quieta, deserta, escura e eterna.

Nesta última não vemos seus moradores, só podemos através das lembranças, das recordações, da memória, sentir as suas presenças.

No cemitério ainda tenho fôlego. Estou sobre a terra, mas é inevitável, o pensamento me revela que estou pisando onde será o último lugar que estarei nesta terra antes de partir para o andar de baixo fisicamente e andar de cima, espiritualmente.

Os que estão nas sepulturas não é como o pôr do sol que amanhã o veremos novamente. Não tem retorno, nem volta, só se nasce e falece uma vez.

Na morada dos mortos, a quietude, o respeito, a dor, a tristeza, reinam. Os olhares se mantém distantes e perdidos.

O luto, a reflexão, as lembranças, as lágrimas, as orações, a saudade, são tão somente, visitantes.

Embaixo do solo, no buraco, a sete palmos de profundidade, quem talvez comanda, seja a escuridão, a frieza, a solidão, o esquecimento, o mistério, a eternidade.

Não estamos aqui em cima por inteiros. Um pouco de cada um de nós, enterrados estão nessas covas: um irmão, uma mãe, um pai, um avô ou uma avó, uma filha, um esposo, um ente querido, um amigo do peito.

Dia de Finados é quase da mesma idade da morte. Há milênios que a data rende homenagens aos que partiram.

Finados quer dizer que é o fim no sentido carnal, entretanto, para muitos a morte leva o físico, mas o espírito permanece entre as pessoas enquanto elas têm memória e vida.

Neste dia de lembranças, de homenagens, de saudade, de recordações e visitas aos túmulos, com certeza, se eles, os mortos, pudessem - ou podem mesmo, quem sabe? - sentir a sinceridade dos corações, das orações externadas nesse momento, diria que a luz que resplandece das velas ilumina e aquece o espírito... as flores, as rosas, propicia um cheiro gostoso às narinas... a magia da visita é como um abraço apertado... as orações penetram e ventilam o espírito.

Diante dos restos mortais encobertos pela areia, o arrependimento demonstrado pelo vivente é aceito, e então, é liberado perdão pelo falecido.

Os agradecimentos, visivelmente, são colocados para fora e, reciprocamente, sentido pelas almas que se foram. As lágrimas derramadas são gotas de água refrescante de amor derramada da face, sugada veloz e gostosamente, pelo túmulo.

Essa morada chamada de cemitério é o futuro de todos nós. A eternidade.

Um dia chegamos, causando alegria e no outro, partimos, deixando tristeza. Uma frase diz que "a vida é incerta, mas a morte é certa". A existência é um círculo, uma roda. O ponto de partida é o mesmo da chegada. "Do pó viemos, ao pó voltaremos".

Assim como estivemos juntos na vida, em breve, estaremos juntos na morte.

Creio não ter medo da passagem, é lógico, que não queria partir tão cedo, prematuramente. Sei, também, que nunca estaremos sozinhos. Do outro lado têm muita gente boa. Muitas mesmo.

Possivelmente irei viver novamente para sempre, junto com meu irmão, meu pai, meus avós, minha tia, meus familiares, amigos e conhecidos, lá em cima ou aqui mesmo, debaixo do solo, seja lá aonde for a casa da eternidade.

Não sabemos de onde viemos e nem para onde iremos. Só Deus tem a resposta. Acredito que haverá um momento em que Ele irá nos revelar.

Não sei se eu ou você irá primeiro, mas enquanto isso, aqui neste lugar, ao passo que respiramos e cada vez mais perto do fim, muito certo, que seremos lembrados, com tristeza ou alegria, no Dia de Finados.

 

 

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