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Um olhar sobre como e para quê acolher em tempos de incertezas

Um olhar sobre como e para quê acolher em tempos de incertezas

Data de Publicação: 28 de fevereiro de 2022 13:10:00

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A palavra acolher deriva do latim, accolligere, que significa receber, recolher, retirar, juntar, reunir, dentre outras miríades. Desde a elaboração da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), em 2015, tem-se discutido com mais afinco a relevância desse termo no âmbito educacional, principalmente quanto a sua potencialidade no desenvolvimento de competências socioemocionais. Apesar de iniciativas esporádicas e isoladas terem se mostrado aparentemente exitosas, o caráter polissêmico do termo sinaliza para a necessidade de aprofundamento de estudos sobre o mesmo.

A controvérsia tem centrado na pluralidade das acolhidas ao estudante e dos respectivos resultados. Empiricamente, é possível subdividir as opiniões majoritárias dos professores em pelo menos dois grupos distintos, a saber: de um lado, os que entendem que a acolhida desperta o sentimento de pertença e convida o aluno e a aluna para se apropriarem dos conhecimentos necessários para sua formação e, do outro lado, estão os docentes que vislumbram e simplificam a acolhida como um dispositivo mestre na resolução de problemas centenários que circundam a educação. 

A esperança de evitar o risco de acolhidas equivocadas e/ou que pouco ou nada acrescenta na vida escolar de alunos e alunas, é o combustível que impulsiona a reflexão sobre o questionamento: Como e para quê acolher o estudante em tempos líquidos? Em tempo, importa lembrar que tempos líquidos é utilizado aqui em consonância com o entendimento do sociólogo polonês, Zygmunt Bauman (1927-1917), para quem tudo muda muito rapidamente. Nada é feito para durar, ou seja, para se solidificar.

Pouco mais de dois anos de início do ostracismo devido à pandemia da Covid-19, a escola reabre os portões para receber os que ficaram órfãos de pai, mãe, irmãos, tios, avós e/ou amigos; os que foram forçados a mudar sua rotina e passaram conviver com a dor e o medo; aqueles que tiveram seu cardápio nutricional reduzido, vez que os provedores da família ficaram sem trabalho; os sobreviventes de violências de natureza diversas; os sedentos pela aprendizagem e os que não fazem questão de lembrar-se da última aula; aqueles entediados com jogos online, redes sociais e programações de plataformas streamings, com dificuldades para discernir se os ataques militares russos sobre a Ucrânia, correspondem a um triste cenário fruto da Geopolítica contemporânea ou se é uma ficção de Hwang Dong-hyuk, diretor e criador de Round 6.

Nesses tempos líquidos, torna-se imprescindível que a acolhida aconteça de modo permanente e nos mais distintos espaços da escola – portão de entrada/saída, pátio, quadra poliesportiva, biblioteca, sala de aula - de modo que o acolhido desperte um olhar positivo sobre a instituição, compreenda a relevância na/para sua formação, potencialize sua disposição para os estudos, sinta alegria em estar nesse emaranhado de trocas de conhecimentos com os pares e reconheça o seu papel na construção de uma sociedade mais justa, equânime e sem guerras.

A acolhida é intrínseca aos movimentos gestuais, ao tom de voz nos cumprimentos verbais, a alegria desabrochada nos encontro e/ou reencontros e no olhar acolhedor do receptor, vez que as variantes da pandemia têm impossibilitado os contatos físicos como outrora. Na esteira dessa educação não hierarquizante e não verticalizada, está a sensibilidade, o compromisso e a disposição do educador em encorajar o estudante a superar suas dificuldades; despertá-lo para um futuro promissor; ofertar conhecimentos condizentes com o ano/série atendendo suas demandas; propiciar espaços debates e orientá-lo quanto ao respeito acerca de ideias não compartilhadas; promover a desconstrução de visões estereotipadas e narrativas preconceituosas, discriminatórias e segregacionistas, vez que as diferenças precisam ser vista como pontes para unir e não como muralhas para distanciar. 

Assim sendo, parece não haver dúvida quanto à relevância da acolhida, entretanto, o seu diferencial na vida do aluno e da aluna passa necessariamente pela bagagem/trajetória constitutiva do acolhedor, ou seja, do entendimento do docente quanto à função da escola no atual contexto histórico e da lucidez quanto ao seu papel para/na formação dos ávidos ou não pelo conhecimento em tempos fluidos.

Por Aparecido de Souza - Mestre em Educação e Professor na Rede Pública de Ensino

Autor do livro: Vitinho – breve história do cowboy que conquistou o mundo.

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