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COLUNA DA SEMANA: O PRETO E O BRANCO

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CONTA-GOTAS

Por Adriano Aparecido Nogueira

 

O PRETO E O BRANCO

As crianças correram para dentro de casa – as mais novas chorando, gritando – assustadas com o barulho. Parecia que um grande avião, “um jumbo”, estava voando muito baixo, aterrissando ou, misericórdia... caindo ali por perto. Muito forte o som. A mãe, sem saber o que estava acontecendo, tentou proteger os seus, quando ouviu o tio dizer para ficarem calmos que era apenas a siderúrgica testando o forno.

Esses testes pegaram os desavisados de surpresa. Depois a notícia se espalhou e vieram os comentários: “o desenvolvimento voltou a Ribas”, “som do progresso”, “que bom ouvir esse barulho”, “eu amo esse barulho”, “a gigante acordou”. Teve um senhor falando que o pozinho fino, preto, que faz mal aos pulmões ia voltar, porém, rapidamente, corrigiu, afirmando, que com certeza, a empresa iria usar o filtro.

Todas essas ações, essas movimentações, misturadas, com tanta expectativa e perspectiva de um futuro promissor nos próximos anos têm sido a mola propulsora, o oxigênio, a esperança de nossa cidade. Bem nítido e notório, vemos estampado nos rostos dos cidadãos Rio-pardenses o contentamento, a alegria, a motivação e a felicidade diante da reativação das operações e do retorno das atividades da Vetorial Siderurgia. E assim tem acontecido. Empresas chegando, firmas sendo abertas, outras reabrindo, aumento significativo de emprego e trabalho. Nas redes sociais, diariamente, há pessoas postando, com orgulho, a frase: “começou um novo emprego em... empresa tal”.

No meio de tanta empolgação, o neto chegou da escola e perguntou ao avô que era ferroviário aposentado. – Quem chegou primeiro em Ribas do Rio Pardo, o gado, o ferro ou o eucalipto? Provavelmente na aula o garoto estudou sobre esses acontecimentos atuais e a economia do município. O velho disse: – sente-se aqui, vou te contar o que sei.

A história nos revela que foi o gado, a pecuária. Os desbravadores vindos de outros lugares, de regiões distantes, descobriram estas terras e acharam excelentes para a criação de bovinos. Tivemos a vinda de dezenas de outros pecuaristas para cá. Por muitos anos foi a principal atividade econômica. Este animal foi eternizado na letra do hino da cidade, escrito por Otávio Gonçalves Gomes, onde cantamos “os bois pastando, mugindo, trazendo riquezas pra terra”. O nosso território é muito grande, com centenas de fazendas. Somos o sexagésimo quinto (65°) maior município do Brasil, e isso favoreceu a recebermos o título de “Capital do Gado”. Éramos o maior criador de gado do país. O Sindicato Rural Patronal para comemorar e registrar a honra, contratou um artista para esculpir a estátua do boi branco que se encontra no trevo da entrada da cidade. O boi branco permanece majestoso e nós caímos para terceiro lugar. Em ano de olimpíadas, diríamos, que somos medalha de bronze.

Em 1914 a linha de ferro carrega o trem de ferro, que por sua vez, traz bastante ferroviários e muita gente de fora. Naquela engenhoca grande, puro ferro, barulhenta, de buzina forte, trouxe o progresso para essas bandas. Vou te contar um fato. Certa vez, informaram que viria uma locomotiva a vapor bem maior, capaz de carregar dois vagões. De boca em boca todos ficaram sabendo que haveria a primeira viagem de passageiros. Os agentes da estação, logo, logo, venderam todas as passagens. Foi uma novidade. Um alvoroço. Estação lotada dos que iriam viajar e dos curiosos para verem o evento. A máquina apitou na curva, o povo comemorou. Foi encostando, imponente, gigante, soltando fumaça e faíscas de fogo pela sua chaminé. A maria fumaça tinha vindo com um vagão. Enfim, foram realizadas as manobras e engatou o vagão de passageiros. Você precisava ver, meu neto, a alegria das pessoas quando autorizaram a entrada no passageiro. Foi emocionante. O vagão ficou lotado pelos viajantes. Suas cabeças pelo lado de fora da janela acenando e sorrindo para os seus familiares e amigos. Chegou a hora. Um dos agentes avisou que o trem iria partir. A máquina funcionou, aqueceu e apitou, piuííí! Fez um chiado. O inesperado. Não saiu do lugar. Novamente iniciou a partida, piuííí! Moveu um pouco. Várias tentativas e nada. Frustação. Não houve a viagem. Infelizmente, a locomotiva maria fumaça não conseguiu puxar os dois vagões.

Tudo foi compensado adiante. As rodas de ferro da maria fumaça de ferro sobre os trilhos de ferro nos faziam ter acesso a outras riquezas. E de “Fazenda Rio Pardo”, de “Vilarejo de São Sebastião”, de “Distrito de Três Lagoas” e de “Distrito de Paz Conceição do Rio Pardo”, nos tornamos a cidade de Ribas do Rio Pardo.

O cultivo de pinus e eucaliptos começa a desenvolver na década de 1970. As plantações se intensificam nos anos a seguir, e visivelmente, percebemos o crescimento das florestas. O gado passa a dividir o território com as árvores de pinus e eucaliptos. O pinus se destaca e traz vários empresários do ramo de serraria. Abastecia as madeireiras, que em dado momento, tínhamos dezenove (19) em operações. O pinus permaneceu em evidência por alguns anos e depois foi diminuindo significativamente. Ao inverso, a cultura do eucalipto veio crescendo. A oportunidade da fabricação do “ouro preto” – carvão – estava propícia. A leitura do cenário econômico foi feita. Rio-pardenses começaram a trabalhar, outros carvoeiros vieram, as carvoarias foram instaladas. A queima do eucalipto nos fornos deu origem ao carvão vegetal. O senhor Jesuíno Álvares de Barros – que fora vereador – era um desses carvoeiros “fortes” da época.

Bom, tínhamos grandes florestas de eucaliptos, inúmeras carvoarias gerando carvão. Os mineiros aproveitaram o momento, abriram a empresa e construíram a Sidersul Siderúrgica. Estávamos, literalmente, produzindo ferro. Esse ferro-gusa gerou uma melhora na economia, ajudou no desenvolvimento e trouxe crença no futuro. O interessante que, no tempo do calendário, devido uma crise econômica vivida pelo país, a usina encerrou sua produção de ferro-gusa no dia 29 de agosto de 2014, segundo informações de uma funcionária. Deixou muitos desempregados e causou incertezas à cidade. O curioso é que no dia 28 de agosto de 2021, um dia antes, na véspera, de cravar 7 anos de portas fechadas, reabre e coloca a usina para funcionar novamente. Com todo este alarde, a Vetorial está comunicando, como diz o ditado popular que “o bom filho a casa torna”. Nesse caso, a casa também é muito boa e a recebe com todo o prazer.

O adolescente disse: – Como o senhor sabe de tudo isso? – Lendo muito, pesquisando e conversando, principalmente, com os mais velhos, como você está fazendo agora. Com uma alegria, um brilho resplandecendo em sua face, respondeu: – Amanhã vou contar aos meus amigos. O ancião continuou: – Calma aí! Espere um pouco. Ainda não acabou.

O australiano eucalipto estava presente na chegada da ferrovia em nossa terra. Entre as inúmeras utilidades desta madeira, o seu plantio em território brasileiro, em grande escala, teve início, aproximadamente, em 1904 para atender a Companhia Paulista de Estradas de Ferro que o utilizou como dormentes nos trilhos da linha de ferro e lenha como combustível nas locomotivas, ou seja, quando o trem chegou, andava sobre o eucalipto e sendo impulsionado pela queima, pelo fogo, do mesmo.

Meu neto, Ribas do Rio Pardo hoje, está apoiado nesse tripé. Os três segmentos mais importantes para a nossa economia. O gado é criado juntamente, no meio da plantação de eucalipto num sistema chamado Silvipastoril. Das florestas o eucalipto é cortado, transportado, vai ao forno, vira o carvão, que por sua vez, se torna ferro na usina siderúrgica. De um processo complexo e extraordinário extrai a celulose do eucalipto, que em seguida, se transforma no papel branco.

Diria na linguagem da sétima arte, que é o cinema: – “o eucalipto, de ator coadjuvante, se tornou o papel principal desse elenco no filme que conta a história de Ribas do Rio Pardo, Mato Grosso do Sul, Brasil”.  – Então, não tem nada de assustador nesse barulho. Que legal! Gostei muito. Obrigado vovô. – Agradeceu o estudante.

 

 

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